segunda-feira, 19 de março de 2012

Desafio Literário (de fevereiro): Lolita - Vladimir Nabokov

Palhaçada esse meu desafio literário, né? Dois meses, dois atrasos. Pessoas já disseram que meu ritmo de leitura é invejável. Aí eu digo que estou lendo Lolita desde... (pausa pra olhar o histórico de renovações no site da biblioteca) 22 de fevereiro, pouco mais de trezentas páginas de narrativa. Eu poderia culpar a inconveniência dos últimos dias, o muito o que fazer, o retorno das aulas, o trabalho em ritmo alucinante, a crise alérgica, a crise mundial, a crise moral - uma misturinha louca que me faz chegar em casa pedindo pro mundo acabar enquanto eu estiver dormindo.

Colocar a culpa no livro é muito mais fácil. Ainda mais nesse livro. Posso dizer, por exemplo, que o livro me causou emoções demais, impressões demais, e que, por isso, eu precisava de um tempo para me recuperar entre uma leitura e outra. Ou você acha que é fácil ler a autobiografia de um pedófilo? Não, não é nada fácil ficar mudando de opinião o tempo todo sobre os personagens. Passar de aquela-vontade-de-dar-uma-joelhada-no-documento pra aquela-vontade-de-colocar-no-colo-e-fazer-carinho-no-cabelo não é fácil mesmo. Aquele desgaste emocional que só um texto emocionado pode lhe proporcionar.

Também posso usar como desculpa o grande exercício mental pra não ser preconceituosa com os personagens do livro. Porque não dá, absolutamente não dá, pra ultrapassar a vigésima página se ficar julgando a narrativa de Humbert como se ele já estivesse condenado. Ele também tem coração. E ele quer se explicar. Não dá pra prestar atenção no que ele diz se ficar o tempo todo retrucando. E não é fácil desligar o julgômetro.

Outra ótima razão pra ler devagar é que, embora o ritmo seja bastante bom na maioria das vezes, a narrativa esmorece em alguns pontos - principalmente nos primeiros capítulos da parte dois. Sim, porque às vezes o próprio livro pede pra ler devagar. É muito diferente ler três páginas de diálogos e três páginas de descrição de uma parede. Nisso achei Vladimir Nabokov um pouco parecido com Machado de Assis, só que nem tanto. Não sei se achei menos chato porque li Dom Casmurro há muito tempo, num tempo em que não tinha a menor paciência pra esse tipo de coisa, ou se essa característica descritiva é menos acentuada em Lolita. Acontece que as descrições são importantes para a história e é preciso abstraí-las completamente. Um exercício de imaginação um tanto complexo.

Por fim, tenho que confessar que eu torci contra Dolores quase o tempo todo. Aí fiquei com pena dela no final, mas só um pouquinho. No fim era uma mistura de 'coitada...' com 'bem feito!'. Acho que é inevitável não ficar tentando entender o Humbert. Acho que, durante toda a narrativa, o seu objetivo é entender a si, seus instintos e sua moralidade o tempo todo lutando no seu interior. Aquela sensação de você-está-fazendo-isso-errado. O que eu acho mesmo é que preciso conversar com alguém que leu Lolita. Quem se habilita?
Extras

O exemplar que eu li veio da Biblioteca de Humanas, Educação e Artes da UFPR (um beijo!). A capa com certeza tinha sido feita ali mesmo, uma capa dura azul, provavelmente porque arrebentaram com a capa original (vamos cuidar dos livros da biblioteca, gente?), mas a edição era essa da Folha, com tradução de Jorio Dauster (que achei bem boa), primeiro livro da coleção Biblioteca Folha. No link da edição tem outras informações interessantes sobre o livro, inclusive artigos publicados na Folha sobre a obra. E o exemplar foi doado por um professor do meu curso (informação irrelevante do dia!). Apesar de ter a letra pequena (eu achei, mas sou cega), é uma edição de bolso, então não dá pra reclamar. 

No Skoob do livro dá pra ver outras edições. Lolita no Brasil está somente no catálogo da Alfaguara, apesar de já ter sido publicada pela Companhia das Letras, inclusive pela Companhia de Bolso, pela Record, pela extinta Círculo do Livro... A edição da Alfaguara tem tradução de Sergio Flaksman e uma arte de capa linda (desejei). Apesar de Vladimir ser russo, quem gosta de ler no original pode ficar mais tranquilo porque a obra foi escrita em inglês. O livro aparentemente ainda não está em domínio público, então quem quiser deve comprar, pedir emprestado de quem tem ou procurar uma biblioteca, tá?

Lolita foi adaptada em pelo menos dois filmes (1962, direção de Stanley Kubrick, o cartaz é ótimo) (1997, direção de Adrian Lyne), um musical, quatro peças de teatro, uma ópera completa e dois balés e ganhou uma paródia de Umberto Eco, Granita. Os termos 'Lolita' e 'ninfeta' ficaram registrados na cultura pop como a designação da garota sexualmente (e precocemente) desenvolvida. Daí muitas referências em músicas - de Katy Perry e Celine Dion a Marilyn Manson e The Police, filmes - Beleza Americana (1999), Flores Partidas (2005), Manhattan (1979), e outros livros - O Diário de Lô (foi publicado pela Objetiva, mas está fora do catálogo), Lendo Lolita em Teerã (A Girafa e BestBolso), entre outros.

Pra quem gosta de livros altamente recomendados, vou lembrar que Lolita consta nas listas da Time (Os 100 melhores livros de ficção publicados desde 1923), da Modern Library (Os 100 melhores livros de ficção), do Le Monde (Os 100 livros do século) e na World Library (uma lista dos cem melhores livros organizada em 2002 com consulta de 100 autores de 52 países). Pra quem gosta de coisas proibidas, Lolita já foi censurado na França, Inglaterra, Argentina, Nova Zelândia e África do Sul. Apesar disso, não achei as cenas picantes tão picantes. Só o tema que é bem pesado, mas narrado com bastante... pudor.

Vocês gostam de ler essas informações extras além da resenha?