quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Cem Anos de Solidão (Gabriel Garcia Marquez)

"Esta casa de loucos!"

Eu poderia parar por aí porque o famoso bordão da matriarca Ursula resume bem a história toda. É uma casa de loucos. Mas que loucos? Que casa? Bom, parece que parar por aqui não é uma boa ideia, afinal.

A edição que eu li, essa antiga que ilustra o post, foi emprestada da Biblioteca de Humanas da UFPR. Acabadinha, mas muito lível. Pena é que alguém fez comentários a caneta em alguns trechos do livro. Gente, se o livro é seu, rabisquem como queiram. Mas se você não pretende ficar com eles para sempre, se pretende doar para uma biblioteca pública, então rabisque a lápis, pelo menos. Sério, atrapalha a leitura tanto quanto assistir um filme com alguém puxando chamando sua atenção o tempo todo pra fazer um comentário. Agora se esse livro foi rabiscado por alguém que pegou emprestado da biblioteca, eu não quero nem pensar, viu?

A tradução aqui é digna de nota. Dizem que tradução que é notada não é boa tradução, mas o caso aqui é diferente. É que em momentos específicos do livro, expressões que foram criadas pelo autor para exprimir alguma coisa muito específica no seu idioma ou na sua cultura, existem notas da tradutora Eliane Zagury sobre conversas que ela teve com o Seu Gabriel, explicando o que ele disse daquela expressão. Eu tive sentimentos bipolares em relação a essas notas. Amava, porque ficava ainda mais impressionada com a ideia do autor, mas odiava, porque ela não me deixava descobrir isso sozinha. A edição que eu quero ter é outra, com tradução de Eric Nepomuceno. Antes, só porque era a mais bonita do mundo. Agora, porque eu quero ler de novo e comparar.

O enredo trata a história de uma família, mas também de um povoado, por gerações e gerações, desde o início até o apocalíptico fim. Que a família Buendía é estranha dá pra perceber logo de cara. Bastaria mencionar que as sete gerações repetem sempre os mesmos nomes de José Arcadio, Aureliano, Úrsula, Amaranta e Remédios. Esse fato poderia tornar a leitura complicadíssima - e há quem não consiga ler sem uma árvore genealógica da família Buendía por perto - se a obra não fosse caracterizada pela construção tão minuciosa dos personagens, física, mas principalmente psicológica. Nessa casa de loucos, cada um tem hábitos, caráter e - por que não? - missão diferentes, mas ao mesmo tempo, cada Aureliano é exatamente igual ao outro, assim como cada Arcadio tem sua marca inconfundível de loucura.

A minha personagem favorita é a matriarca Úrsula, que eu comecei odiando. Sim, porque no início do livro ela me pareceu uma daquelas pessoas reacionárias que vive com medo de fazer algo grande, só porque pode dar errado. Eu me enganei. Úrsula é grandiosa, e só o fato de ter vivido tantos anos sem enlouquecer (ou será que eu é que não percebi sua loucura?) em meio a tanta loucura é um fato notável. Sem contar que carregou a família toda nas costas até o fim de seus dias, numa força inigualável que eu desejo possuir.

A história é bastante melancólica (claro que o livro foi super indicado pela Ju Fina Flor, que já gosta de uma leitura deprê, e que eu tinha certeza que tinha um post sobre ele, mas ainda não tem, não), tanto que eu recomendaria uma nova edição com um aviso de contraindicação para pessoas com tendência à depressão. Esse livro fez parte de um projeto de leitura a dois (a próxima leitura compartilhada será 1984), e eu quase tive que salvar meu companheiro da beira do precipício (sou exagerada?). Por isso eu não recomendo para todo mundo. Só para os fortes.

Mas se você for uma pessoa forte, não hesite. Eu quero que você se impressione, como eu me impressionei, com a capacidade criativa do autor. Eu quero que você termine um livro boquiaberto, como eu terminei, com um final totalmente previsível, mas, ainda assim, totalmente fantástico. Eu quero que você tenha a oportunidade de ler Cem anos de solidão, assim como eu quero que você tenha a oportunidade de apreciar o por do sol no Arpoador. Entendeu? É um desejo. Assim como se deseja um feliz ano novo, eu desejo uma leitura... não exatamente feliz. Seria bem paradoxal desejar uma feliz leitura de um livro tão melancólico. Mas uma leitura intensa, profunda e provocativa, isso eu lhe desejo. Do fundo do meu coração.

Outros links:
A resenha do meu companheiro de leitura.
Página do livro no Skoob