terça-feira, 15 de março de 2011

Orgulho e Preconceito - Jane Austen

Eu sempre digo que o grande encanto dos livros está na identificação dos personagens com o leitor. Uma boa história, um belo cenário muito bem descrito, bons diálogos, nada disso supera o critério caracterização dos personagens. Mesmo porque personagens com características bem definidas, marcadas e transmitidas se deixam conhecer, se tornam nossos amigos. Sabemos quem fala, mesmo quando o autor não indica. Conhecemos sua voz. Reconhecemos os traços de sua personalidade e comparamos aos nossos, criando simpatia ou antipatia.

Livros com narrativas extensas em geral são cansativos, mas não quando a autora é Jane Austen. Sim, as narrativas dela são extensas, mas ela sabe narrar. Ela sabe tornar diálogos desnecessários quando nos apresenta tão adequadamente aos seus personagens. Podemos imaginar as cenas que se passaram como quando ouvimos relatos sobre nossos próprios amigos. Prevendo suas reações. Imaginando a cara que fizeram. O tom de voz ao se expressar. Os olhares, no plural. Me envolveu de forma tão carismática que, mesmo tendo lido apenas dois de seus livros, já lamento por saber que não restam muitos.

Orgulho e Preconceito é o romance de Elizabeth e [ai-Senhor-que-nome-é-esse] Fitzwilliam, que tem como pano de fundo as relações sociais aristocráticas na Inglaterra de dois séculos atrás. Alguns podem achar isso marcante, relevante, mas é só o contexto. O mais emocionante nesse relacionamento é a constatação de que o amor transforma. Ao ser desprezado por Elizabeth, Mr. Darcy (não poderia ser Sr. Darcy?) cai na real e percebe como é uma pessoa chata e esnobe. E resolve mudar, para se considerar digno de seu amor.

Querer consertar o outro é uma tentação constante em um relacionamento. Existem livros que ensinam a fazer essa intervenção cirúrgica na personalidade alheia. Não adianta. Caráter e personalidade são tão essenciais ao ser que nenhuma outra pessoa deve se sentir tão íntima de alguém a ponto de se permitir pensar em querer mudar alguém. Mudanças verdadeiras só acontecem quando a pessoa resolve mudar. E que seja por amor, e não por estar de saco cheio!

A transformação de Mr. Darcy não o transforma em outra pessoa. Pelo contrário, revela todas as suas melhores qualidades. (Às Lizzys que procuram pelo Mr. Darcy - só com as qualidades - sinto informar que ele já está ocupado, e muito bem ocupado tá? Vão ler outro romance...) Mr. Darcy descobre que pode agradar a uma mulher digna de ser amada, porque ele mesmo, com todo seu egoísmo, esquecera de que isso fosse necessário. Descobriu, finalmente, que o que importa é o caráter das pessoas, não o sobrenome, e passou a exercitá-lo.

O livro não termina com declarações de amor (Como li em alguns spoilers. Não criem essa expectativa.), com um beijo apaixonado ou expressões romantizadas. O último capítulo é como um epílogo que mostra que eles não foram felizes para sempre, mas que enquanto viveram sua felicidade durou. Eles aceitaram o compromisso de manter o amor que tinham, e de ceder, de vez em quando, por amor.