segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Desafio Literário (de janeiro): Comer, Rezar, Amar (Elizabeth Gilbert)

"O tipo de livro que eu não imaginaria que você leria". Uma mistura de autoajuda com auto-biografia, e com certeza por isso se tornou um best seller. Cheio daquelas frases tocantes, sabe como é, não sabe? Cheio daquelas coisas que, no fundo, todo mundo sabe, só que às vezes se esquece. Por exemplo, que é bom ter um tempo só pra você. Ou que relacionamentos são difíceis. Ou que você precisa saber conviver consigo, com seus pensamentos e com sua própria solidão, antes de conviver com outras pessoas.

Não foi nada transformador. Francamente, quem se diz "transformada" por um livro como esse precisa de muita coisa na vida. Não que seja um livro ruim. Foi uma leitura agradável. Muito agradável, na maior parte do tempo. O ritmo do livro é quase sempre bem marcado. A personagem principal - a autora, né? - se expõe na medida certa. Você se sente próxima. E ela tem senso de humor, o que é ótimo. Mas, caramba, é um livro, com uma história, que nem é a melhor do mundo.

A narrativa mescla o tempo presente com os flashbacks que são uma espécie de por que eu cheguei até aqui. E eles são bastante frequentes na primeira parte que, paradoxalmente, fala sobre prazer. Digo paradoxalmente porque são lembranças bem feias, daquelas que a gente não quer lembrar. Divórcio, abandono, depressão, e esses sentimentos de falta de fé na vida que eu simplesmente não consigo aceitar, muito menos entender.

Então vem o prazer. Eu me lembro das aulas de sociologia no meu primeiro ano de faculdade (e ó, faz teeeempo) em que o meu professor dizia que o hedonismo (que é uma doutrina que afirma que o homem chega ao seu objetivo supremo através do prazer, mas que, na época, ele definiu apenas como a busca pelo prazer) era um grande mal dessa época. Outro paradoxo: essas pessoas que tão desesperadamente procuram o prazer, procuram nos lugares errados e pensam que encontraram. Elas não sabem sentir prazer.  Sabe aquele sujeito que sai de férias, mas não consegue relaxar? Aquelas pessoas que comem, mas não sentem o gosto da comida? Que viajam, mas não param pra apreciar o pôr do sol?

(Vamos abrir um parênteses para falar sobre a gastronomice do livro, já que ficou na categoria literatura gastronômica do Desafio Literário: eu fico com fome só de pensar nas delícias tão cuidadosamente descritas no terço italiano do livro. Basta?)

Mas parece que o prazer é feio. Porque depois sempre vem aquela culpa, né? Você está aí de férias, enquanto poderia estar ganhando dinheiro. Está comendo essas calorias que vão parar no seu quadril e não sairão nunca mais. E porque parou pra ver o pôr do sol, acabou pegando esse trânsito horrível na Avenida Iguaçu. Ou por que, afinal, você não deixa essa vida capitalista mesquinha para se dedicar a algo maior? Parece que a devoção é o oposto do prazer. Mas tem que ser? Elizabeth passou meses dentro de um ashram, num retiro espiritual. Todo o auto-conhecimento e a libertação dos fantasmas que ela ainda abrigava valeram a pena. Mas será que a devoção é mesmo o oposto do prazer?

Então vem o equilíbrio. E, com o equilíbrio, o amor. Chegam de mãos dadas, com suavidade, um empurrando o outro. O fato é que quando você está bem consigo, você consegue ficar bem com os outros. Quem não se suporta é mesmo insuportável. Então a busca pelo equilíbrio, na verdade, fala sobre todo tipo de relacionamento e sobre toda forma de amor.

Mas ninguém precisa ir à Itália para ter prazer na vida. Nem se trancar num retiro espiritual para se encontrar com Deus. Ou consigo mesmo. Muito menos passar em Bali para descobrir o que é ter uma vida equilibrada. E ninguém precisa ler Comer, Rezar, Amar para descobrir isso. Por isso que esse livro não transforma. Só fala de algumas coisas óbvias que talvez você não tenha prestado atenção.

Site da autora

PS: Estou lendo Comprometida e gostando muito mais.